A diferença de idade em relacionamentos

Desde que eu assisto filmes e séries americanas – ou seja, desde sempre – percebo o quanto eles torcem o nariz pra qualquer diferença de idade em relacionamentos. E claro que eu também percebo todo um moralismo e esse lance de cagar regra na vida alheia que eu acho pééééssimo, mas… Mas… Mas… Ao mesmo tempo, acho que vale a pena perceber quando algumas coisas são sintomas de uma cultura que pode ser problemática.

Enquanto isso, ao meu redor, vejo o quanto é naturalizada a parada de caras vinte anos mais velhos namorando meninas que podiam ser suas filhas, como o Roberto Justus namorando uma menina 32 anos mais jovem do que ele e ainda se gabando disso (“Claro, seria mentiroso da parte de um homem dizer que preferimos uma mulher da nossa idade a uma mais jovem.“). E todo mundo acha absolutamente ok. Talvez seja. Não sei. Mas acho que vale a pena questionar até a questão dos papéis de gênero, e por que é tão OK para nós o cara ser 32 anos mais velho que a mulher e ao mesmo tempo tanta gente zoar com a Suzana Vieira por ter namorados mais jovens que ela. Acho que aí é que está o grande problema para mim. Não é o namoro individual seu com a sua 9inha que apesar de cents anos mais nova é super madura e inteligente. Mas a questão coletiva mesmo, de acontecer isso o tempo todo e tudo certo tudo lindo, é amor e amor não tem idade… (Só quando o mais velho for homem.)

Daí fui ler a respeito.

Historicamente já existiram todos os tipos de atitudes com relação a disparidade etária nos relacionamentos – desde uma aceitação normalizada até tabu total. E, claro, a definição exata de uma disparidade etária “significativa” também vai variar entre sociedades. Em alguns lugares 5 anos de diferença é considerado um montão, em outras é normal. E, claro, esa diferença tem tudo a ver com a visão que a sociedade tem de idade do consentimento, casamento, papéis de gênero e também das percepções das diferenças sociais e econômicas entre os grupos etários.

E descobri que a diferença de idade média no “mundo desenvolvido” (seja lá o que desenvolvido significa) é entre dois e três anos, com a mulher sendo mais nova. No final das contas não consegui encontrar dados sobre esse age gap em relacionamentos no Brasil, droga. Mas achei um gráfico com dados dos Estados Unidos:

Age differences for spouses

Ou seja, 31,9% dos casais casados nos Estados Unidos tem diferença de idade menor que 1 ano. Repara só como reduz drasticamente conforme a diferença vai aumentando… Ou seja, o que eu vi nos filmes e séries não é tão fora da realidade.

No tal abstrato mundo desenvolvido, a maioria dos homens casa com mulheres mais jovens que eles, com a diferença sendo entre dois e três anos. No Reino Unido, a média da diferença fica em 3 anos, e nos Estados Unidos, dois anos e meio. O padrão também foi confirmado para o resto do mundo, sendo a maior diferença vista na África.

Mas nem tudo está perdido para as nossas Suzanas Vieiras, já que o padrão aos poucos está mudando. O departamento de estattísticas do Reino Unido concluiu que a proporção de mulheres casando com homens mais jovens na Inglaterra e Gales aumentou de 15 para 26% entre 1963 e 1998. O estudo também mostrou uma taxa de divórcio maior proporcionalmente à diferença de idade quando a mulher é mais velha e diminuiu quando o homem é mais velho. Um estudo de 2008, porém concluiu que essa diferença não é significativa.

As explicações para essas disparidades etárias geralmente focam ou no modelo de escolha racional ou na análise de tendências demográficas em uma dada sociedade. O modelo de escolha racional sugere que as pessoas procuram por parceiros que possam ser provedores para elas. E portanto, como homens tradicionalmente ganham mais conforme ficam mais velhos, as mulheres preferem homens mais velhos. MAS esse fator está diminuindo conforme mais e mais mulheres entram na força de trabalho e a diferença salarial conforme o gênero diminui. As tendências demográficas estão preocupadas com a proporção de gênero na sociedade, marriage squeeze (uma condição sociológica americana onde mulheres negras têm dificuldade em conhecer e casar com homens negros), e padrões de migração. Outra explicação diz respeito a valores culturais: quanto maior o valor atribuído ao fato de ter filhos, maior será a diferença de idade.

Em um estudo da Universidade de Brown, foi percebido que a estrutura social de um país determina a diferença de idade nos relacionamentos bem mais do que qualquer outro fator. Tem um artigo (The Age Difference Between Spouses: Variations among Developing Countries) que fala que a variação etária pode ser diretamente interpretada através de dois conjuntos de fatores: estrutura de parentesco e papéis das mulheres. O que me leva a concluir de um jeitinho bem superficial que só eu consigo que TANTA diferença de idade nos relacionamentos que percebo aqui no Brasil está sim vinculado a uma independência feminina ainda frágil (quando existe) e a consequente necessidade das mulheres de terem um marido como suporte e breadwinner.

Ou seja, falta feminismo nesse país!

3 comentários sobre “A diferença de idade em relacionamentos

  1. Grato pelo desdobramento da questão (puxei link de coment em outra página a retomar com o assunto em contra a naturalização dessa forma, apresentada entre artistas) e escrita excelentemente direta e espirituosa. Confesso que ao ler de uma diferença de 2 ou três anos achei “simbólico”, mas logo quando o olhar chegou nas ondas do gráfico, ele se tornou justamente bem mais impressionante por isso: praticamente metade dos poucos casos de casais com as mulheres tendo mais idade sendo esses (quanto à conclusão, não me parece nada inválida, mas relevante (e rico, linkado…) ensejo para questões de realidade alarmante nos próprios e dramáticos apertos que se atravessa).

  2. Americanos são majoritariamente EVANGÉLICOS!! É sempre bom lembrar isso quando se pensar em conservadorismo americano. Você sabia que lá a prostituição é totalmente proibida em quase todas as capitais? Só em Las Vegas, Nevada ela é totalmente liberada. Mesmo assim, as profissionais do sexo tem que andar com uma carteirinha com os exames de HIV periódicos realizados. Por outro lado, clandestinamente tem prostituição em todas as cidades e americanos consomem muito mais droga que brasileiros. Hipocrisia!!

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